Evento ocorreu em Curitiba e reuniu renomados profissionais das áreas jurídica e securitária para discutir temas relevantes para todos os players relacionados ao setor
Na última terça-feira (05), a AIDA Brasil realizou o 1 Encontro de Seguro Rural, no Instituto dos Advogados do Paraná, em Curitiba. Foi um dia inteiro de palestras de alto nível sobre temas relevantes relacionados ao seguro rural. Dividido em 5 painéis, o encontro abordou os temas “O Seguro Agrícola como Gestão de Risco e a Certificação de Sementes”, “Aplicação do CDC e Inversão do Ônus da Prova”, “Boa-fé e a Proposta no Seguro Agrícola”, “Aviso de Sinistro Tardio ou a Falta Dele Antes da Colheita” e “Desafios e Perspectivas do Seguro Rural”.
O objetivo do encontro foi trazer ao grande público o tema que já vem sendo estudado pelo grupo e promover a relação da AIDA com instituições e profissionais de outras áreas. Transmitido online, pelo canal da AIDA Brasil no Youtube, o evento reuniu grandes profissionais da áreas jurídica e da indústria do seguro como Maria Amélia Mastrorosa Viana, Ramiro Fernandes, Luiz Assi, Inaldo Bezerra, Lama Ibrahim Amélia, Wadi Cury, Sergio Satoshi Kumoto, Thiago Bozelli, Maria Isabel indrusiak Pereira e Cláudia Balsano Costa, além de Edward Lang, Gilson Martins, Anne Caroline Wendler, Alexandre Keiji Taho, o Desembargador Luciano Carrasco Falavinha Sousa e o presidente do Grupo Nacional de Trabalho de Agronegócio e Seguros da AIDA, Juliano Ferrer.
Painel 1 – O Seguro Agrícola como Gestão de Risco e a Certificação de Sementes
Lama Ibrahim deu início aos trabalhos moderando o primeiro painel, que teve como palestrantes Wadi Cury e Sergio Satoshi Kumoto. Em sua fala, Cury mencionou a comemoração dos 20 anos da lei da subvenção e destacou o papel do seguro agrícola como gestão de riscos e na política agrícola. Também convidou os expectadores a refletir e questionar o legítimo interesse segurado do seguro agrícola.
Em sua apresentação, o executivo discorreu sobre a função e o conceito do seguro agrícola, a ISO 31000:2018, zoneamento agrícola e mapeamento de solo. Em sua visão, o seguro agrícola difere consideravelmente das demais modalidades de seguros, pois não trata de idade cronológica, mas sim fenológica. “As plantas têm fases e necessidades complexas. Na agricultura, definir um bom manejo é fundamental. E um bom projeto técnico é essencial para o agricultor. O seguro é um meio, não uma finalidade”, pontuou.
Dentro do tema de seguros, o Cury falou das influências externas ao risco, porque o seguro agrícola é um instrumento de política agrícola. “Em resumo, temos a política agrícola, crédito rural e privado, zoneamento agrícola, risco climático (zarc) e o seguro agrícola”, enfatizou. Por fim, o palestrante fez breves comentários sobre o seguro agrícola em outros países, salientou os objetivos do seguro agrícola, a estrutura das apólices, o papel da subvenção e a evolução do seguro como política agrícola no Brasil. Comentou ainda os principais vetores das ações judiciais no seguro agrícola.
Sergio Satoshi Kumoto, por sua vez, destacou a dimensão territorial do Brasil, a importância da agricultura no nosso País e as oportunidades de crescimento. Experiente nas regulações de sinistros e em auditorias, o profissional trouxe uma apresentação mais técnica, voltada para situações do dia a dia, com o intuito de mostrar como as coisas funcionam dentro de uma seguradora e também no campo.
Kumoto falou sobre o funcionamento do seguro agrícola, contratação, aviso de sinistro, regulação e indenização. Comentou também as situações que reduzem as indenizações, a ocorrência de riscos não cobertos e as situações que indeferem as indenizações. “Os equipamentos que temos em mãos atualmente nos conferem muita confiabilidade e transparência. Conferem exatidão na regulação de sinistros e é isso que a seguradora busca sempre, fazer uma regulação transparente, segura e objetiva”, afirmou.
Outro tema abordado pelo painelista foi a boa-fé. Para ele, a observância da boa-fé pelo segurado é de extrema relevância no fornecimento de seus dados. É o coração do contrato de seguros para evitar fraudes.
Painel 2 -Aplicação do CDC e Inversão do Ônus da Prova
Já no segundo painel, o presidente do Grupo Nacional de Trabalho de Agronegócio e Seguros da AIDA, Juliano Ferrer, ressaltou a complexidade do seguro rural. “Ele reúne muitos detalhes entre o segurado e a seguradora, questões da produção em si, e do manejo. E no final também dificuldades na produção de provas. A questão do ônus da prova é que vai determinar de que forma uma contenda será resolvida “, sinalizou.
Com o objetivo de contextualizar o tema, a apresentação abordou a relação jurídica complexa e pontos como contrato bilateral e sinalagmático, relação de consumo, assimetria informacional e vulnerabilidade. Reforçou as responsabilidades do segurado em relação ao manejo e da seguradora, no que diz respeito ao dever de informar o cliente. Também enfatizou a dificuldade de se provar que o segurado usou de má fé.
Em sua conclusão, Ferrer levantou alguns questionamentos e instigou reflexões. Sua opinião é a de que não há vulnerabilidade do produtor rural. Ou no mínimo essa vulnerabilidade deve ser relativizada. Análise da contenda deve ser casuística, com exame detalhado e aplicando flexibilidade as regras gerais, conforme o caso concreto. “A seguradora deve perseguir alcançar informação completa e clara sobre o produto. O segurado deve assumir responsabilidade por aquilo que declara, por seus atos e por aquilo que contrata”, indicou.
Ferrer finalizou sua apresentação salientando que somente o estudo constante, a reflexão e o debate aberto de ideias e de pontos de vista de forma plural é que poderão trazer avanços para o seguro, tão relevante para o nosso País e para o mundo.
Já o desembargador Luciano Carrasco Falavinha Sousa entende que a aplicação do CDC e da inversão do ônus da prova implica em tornar iguais as partes no âmbito probatório. “As partes têm uma situação técnica hipossuficiente, econômica ou jurídica, que deve ser equalizada”, apontou.
Uma pesquisa publicada no portal Consultor Jurídico (Conjur), dá conta de que, no Paraná, do início de setembro de 2023 até janeiro de 2024, dos 31 julgados selecionados 24 aplicaram o CDC e a inversão do ônus da prova. Apenas um deixou de aplicar. Em São Paulo essa tendência pela corte paulista de aplicação é quase que automática. São vários os precedentes.
Ao longo se sua palestra, Falavinha deu vários exemplos de aplicação do CDC e explanou sobre ônus da prova. Ele defende que em todo e qualquer caso uma análise clara e específica de cada detalhe deve ser realizada. Em sua visão, os advogados das seguradoras devem levar aos juízes elementos técnicos precisos, para que eles possam tomar melhores decisões.
Por fim, o magistrado falou sobre má fé e boa-fé objetiva. “Para os que atuam nessa área o meu pedido é que tragam detalhes para o processo. Não se percam naquela questão genérica de simplesmente se utilizar do capítulo da não inversão do ônus da prova. Reúnam elementos técnicos para que o juiz possa ter base para verificar se se inverte ou não a prova e, a partir daí, fazer um julgamento correto”, orientou.
Painel 3 -Boa-fé e a Proposta no Seguro Agrícola
Thiago Bozelli presidiu a mesa do terceiro painel, que foi composta por Maria Isabel Indrusiak Pereira e Cláudia Balsano Costa. Maria Isabel destacou a importância do papel do setor agropecuário, como base da economia brasileira, e também de sua suscetibilidade a inúmeros riscos, dentre eventos climáticos, praga, guerras com escassez de insumos. “É uma atividade com muitos elementos que a colocam em risco”, advertiu.
A advogada exaltou também a relevância do seguro agrícola como um pilar fundamental da política agrícola, previsto pela constituição federal, como uma forma de mitigação de riscos. O produto também garante a estabilidade da renda de todos os produtores, dentre outros benefícios, como a segurança alimentar, evita a escassez de alimentos e possibilita a concessão de créditos, além de tantos outros benefícios.
“Também em razão disso se faz necessária a adoção de boas práticas por todos que compõem essa relação, para que possamos ter uma agricultura cada vez mais pujante e também para que se possa fomentar o mercado cada vez mais e que as apólices de seguro agrícola atinjam o maior número de produtores”, declarou Maria Isabel, acrescentando que não tem como falar de boas práticas sem mencionar o princípio da boa-fé, que é o princípio fundamental do direito privado.
O Instituto da boa-fé vem positivado em diversas áreas do direito. Está previsto no Código de Defesa do Consumidor, artigo quarto, inciso terceiro, que também fala da harmonia das relações de consumo. A essência do contrato de seguro é a predeterminação dos riscos estabelecida no artigo 757 do Código Civil brasileiro. A apólice de seguro deve estabelecer exatamente o risco que o segurado pretende cobrir e o risco que a seguradora analisou e avaliou e aceitou predeterminar.
A painelista reforçou, ainda, a importância de a seguradora disponibilizar em seu questionário de avaliação espaço para a inclusão de informações/históricos que a auxiliem na apuração, para que possa ter mais elementos para fazer essa avaliação. Em contrapartida o proponente deve responder a estas questões com a mais absoluta veracidade. “Tem que ter essa lealdade, essa eticidade nessa relação”, argumentou.
Cláudia Balsano representou os corretores de seguro, elo entre o segurado e a seguradora, e focou sua apresentação mais na parte comercial. “Quando falamos em boa-fé, ela precisa ser vista por um tripé: o corretor de seguros; seguradora e o segurado, no caso o produtor rural”, disse.
Cabe ao corretor de seguro compreender além dos conhecimentos e práticas inerentes à atividade agrícola. Já o produtor rural precisa prestar os devidos esclarecimentos quando do preenchimento de um questionário de risco para uma proposta de seguro agrícola. Ele deve informar características da lavoura.
O calendário de contratações das seguradoras foi outro ponto abordado por Cláudia. Para ela, a programação precisa ser repensada para que o produtor não perca a capacidade de resseguro ou a subvenção Federal. “Nosso papel, como corretores de seguros, é de responsáveis socialmente por um mundo melhor, por uma sociedade mais justa, por menos problemas de má fé e por muito mais conduções de boa-fé, ponderou.
Painel 4 -Aviso de Sinistro Tardio ou a Falta Dele Antes da Colheita
Luiz Assa moderou o penúltimo painel, que teve as participações de Anne Caroline Wendler e Alexandre Keiji Taho. Anne Caroline discorreu sobre seguro agrícola, tempestividade do aviso do sinistro e suas consequências. Apresentou alguns dados e a conclusão de uma pesquisa relativa aos entendimentos dos tribunais do Sul sobre o tema aviso do sinistro tardio ou a falta dele antes da colheita. “A gente precisa contar com a informação em tempo oportuno, num prazo razoável do segurado. Esse é o ponto o ponto central sobre o aviso do sinistro”, salientou.
Já Taho trouxe informações sobre o laudo digital, que possibilita o segurado a questionar. “Ele pode assinar o laudo, negar as informações e/ou escrever o que ele acha que é contrário. Ele pode discordar daquelas informações do perito. “Isso traz transparência”, ressaltou.
O executivo falou especificamente sobre pontos do seguro, os impactos sobre os avisos de sinistro, que dá ciência a seguradora da ocorrência de um evento coberto pela apólice de seguro. Segundo ele, é comum encontrarmos três pontos nas condições gerais: perda de direito de comunicação nos casos em que o segurado não comunica o sinistro; realização de ações que mitiguem o dano; colheita ou qualquer tipo de alteração na área sinistrada, por parte do segurado, sem prévia autorização da seguradora.
“Isso faz toda diferença na regulação de sinistros. Um corretor bem instruído, especialista, consegue orientar o segurado nesses momentos. Se eu puder deixar só uma mensagem aqui, eu ressaltaria o quão importante é a vistoria in loco. É fundamental que a seguradora possa realizar vistorias na propriedade”, advertiu.
Comunicação intempestiva e romaneio foram outros assuntos comentados pelo especialista em seguro agro. Ele finalizou sua apresentação ressaltando que a seguradora sempre deve ser comunicada do sinistro e autorizar a colheita.
Painel 5 – Desafios e Perspectivas do Seguro Rural
No quinto e último painel, Edward Lang falou sobre o futuro do mercado segurador no contexto das mudanças climáticas, incluindo o segmento seguro Rural. Mencionou o excesso de emissão de gases de efeito estufa, que impactam no aquecimento global, nas mudanças climáticas e outros eventos climáticos extremos.
“Mesmo se atingirmos todas essas metas ou compromissos oficiais dos governos do planeta, ainda assim não será suficiente. Precisamos trabalhar muito fortemente com iniciativas adicionais bem mais urgentes e focadas no que é realmente relevante, para atingirmos a capacidade de mantermos a temperatura do planeta abaixo de 2 graus, a partir do ano 2050”, alertou.
Segundo experts, fracassar na mitigação do aquecimento global é o maior risco para a humanidade. No Brasil, o ano de 2023 foi um recorde em termos de prejuízos climáticos. “E em 2024 o prejuízo deve ser quase o dobro. Esse é o impacto de uma sociedade pouco protegida. Apenas 6% desse impacto tem seguro. Quem paga essa conta? Isso é um atraso no desenvolvimento da sociedade”, frisou.
Edward Lang fechou sua apresentação falando sobre os maiores riscos para a humanidade, que segundo ele são, fracassar na mitigação do aquecimento global, fracassar na adaptação às mudanças climáticas, desastres naturais e eventos climáticos extremos, assim como perdas de biodiversidade e colapso de ecossistemas e migração populacional involuntária em grande escala. A solução é complexa, mas envolve a mitigação das emissões, adaptação e resiliência. “Precisamos urgentemente trabalhar sinergias público-privadas para ampliar o sistema, incorporar mais produtores e mais regiões (volume e diversificação). O crédito rural deve ser o caminho para aumentar a penetração do seguro”, reiterou.
Finalizando o ciclo de palestras Gilson Martins trouxe uma visão do acompanhamento do mundo do seguro, do ponto de vista estrutural, do ponto de vista político. Propôs algumas reflexões sobre a adaptação climática e abordou tópicos como orçamento, fundo de catástrofe, tecnologia, administração pública, zoneamento agrícola, ação regional, capacitação, legislativo (PL 2. 951).
Discorreu também sobre os desafios e tendências do seguro paramétrico, que do ponto de vista tecnológico tem gerado bastante discussão. “Falamos muito de leis e normativas, mas do ponto de vista administrativo no governo é possível fazer muita coisa”, pontuou.
Martins explanou ainda sobre o zoneamento, uma política para definição de janelas de plantio, que é definida em decêndios. É um critério para acesso ao crédito rural, para o seguro rural subvencionado ou não subvencionado. “Temos a necessidade de divulgar a cultura e gestão de riscos no Brasil. Temos uma baixa adesão em várias regiões. Além do mais, quando necessário tomar uma decisão de gestão de risco, os produtores precisam fazê-la baseados em conhecimento”, concluiu.
O 1º Encontro de Seguro Rural foi organizado pelo Grupo Nacional de Trabalho (GNT) de Agronegócio e Seguros da AIDA Brasil e teve o apoio do Instituto dos Advogados do Paraná – IAP, Sindseg PR/MS e Sancor Seguros.
Assista a live completa no canal da AIDA Brasil