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A COMPOSIÇÃO COMO FORMA NECESSÁRIA DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS DE INTERESSES E SUAS TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO

É de conhecimento geral que o intenso volume de demandas submetidas ao crivo do Poder Judiciário Brasileiro é superior à estrutura do Estado capaz de fazer frente aos litígios da sociedade contemporânea.

Evidente que o resultado dessa infraestrutura precária culmina, muitas vezes, na morosidade da prestação jurisdicional, ocasionando, assim, ausência de efetividade na resolução dos conflitos da população brasileira.

Diante deste cenário, o Código de Processo Civil de 2015 elegeu a conciliação como a forma prioritária de solução de conflitos de interesses.

Dentre algumas modificações em face ao CPC de 1973, foi instituída a audiência de conciliação prévia ao debate judicial, oportunizando às partes que solucionem o conflito instaurado antes mesmo de qualquer decisão de mérito, conforme prevê o art. 334 do Código de Processo Civil de 2015:

Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

No entanto, oportuno referir que a autocomposição não é novidade, uma vez que já de algum tempo se percebe na atividade forense a utilização da conciliação, visando maior celeridade na resolução das demandas, bem como proveito financeiro aos envolvidos.

Assim, com o incentivo ao encerramento de litígios através de acordos, foram estabelecidas técnicas de negociação, como o conhecido

método de Harvard, considerado um dos mais eficazes no mundo e desenvolvido por William Ury e Roger Fisher.

Dentre os procedimentos empregados nesta técnica, a proposta é de que todas as partes envolvidas na negociação sejam beneficiadas, devendo serem tratadas como parceiros e não adversários.

Tal abordagem faz com que se crie uma relação mais construtiva, sendo mais fácil lidar com divergências de opiniões e encontrar um ponto comum para qualquer tipo de desentendimento.

Dessa forma, os criadores deste método entendem que o objetivo na condução desta relação criada através da negociação é conseguir o melhor resultado possível para todas as partes envolvidas, que seja justo e duradouro.

Deste modo, os desenvolvedores da técnica de negociação estabelecem critérios para que o objetivo seja atingido. Determinam que as partes construam uma relação coesa, promovendo sempre uma comunicação eficiente e clara, separando os problemas das pessoas.

Os interesses de cada parte devem ser evidenciados e satisfeitos, devendo ser escolhida a melhor alternativa dentre as diversas opções listadas para maximizar os ganhos dos participantes.

Além disso, é previsto neste método que a negociação seja legítima aos envolvidos e que haja um comprometimento entre as partes, com o intuito de que seja estabelecido e cumprido o pacto firmado.

Como mencionado, a técnica referida foi reconhecida mundialmente, atraindo, inclusive, a atenção de grandes escritórios de advocacias interessados em aprofundar os mecanismos de negociações, visando a melhor resolução dos conflitos de seus clientes.

Percebeu-se, assim, que o encerramento de demandas através de acordo pode gerar potencial lucro aos envolvidos, porquanto a lide estabelecida e submetida à apreciação do Judiciário é resolvida em menor tempo, minimizando, assim, gastos com a contratação de advogados, custas e outras despesas processuais.

Neste ponto, necessário referir que entes públicos também se preocuparam em utilizar deste mecanismo, conforme a edição do Manual de negociação e mediação para membros do Ministério Público1.

Logo, a ideia contida no Código de Processo Civil de 2015 vai no sentido de desafogar o Poder Judiciário Brasileiro e que apenas se esgotadas as tentativas para a solução do consenso é que deverá ser submetido o conflito à jurisdição competente.

Incumbe destacar, inclusive, que há previsão de premiações às partes que transacionarem antes de sentença, como por exemplo o art. 90, §3º, do CPC/2015, o qual dispõe sobre a dispensa do pagamento de custas processuais remanescentes:

Art. 90. Proferida sentença com fundamento em desistência, em renúncia ou em reconhecimento do pedido, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistiu, renunciou ou reconheceu.

§ 3º Se a transação ocorrer antes da sentença, as partes ficam dispensadas do pagamento das custas processuais remanescentes, se houver.

Restam evidenciados os benefícios da conciliação no cotidiano forense. Além da maior celeridade na resolução do conflito, destaca-se, também, a promoção da harmonia, da ordem social, ao passo que ambos os envolvidos saem satisfeitos com o resultado da controvérsia.

Destarte, diante do grande avanço e incentivo à conciliação prevista no Código de Processo Civil de 2015, é necessário que os operadores de Direito sofram adequação à nova realidade.

A adoção da conciliação como técnica de resolução de conflitos importa em mudança e desconstrução cultural a ser realizada no modelo e pensamento de litigar por litigar adotado por muito tempo em escritórios de advocacia, tribunais e também nas próprias partes detentoras do direito.

1 Brasil. Ministério da Justiça. Escola Nacional de Mediação e Conciliação. 2014.
Faz-se, assim, mais do que necessário neste momento ajustar uma solução equilibrada, eficiente e mais célere que possa ser preferência na ordem jurídica processual, devendo haver um esforço conjunto dos operadores do Direito, no sentido de conscientizar a importância e os benefícios dessa forma alternativa de solução da controvérsia

Por Bruno Borges Pinheiro Machado

Especialista em Direito Processual Civil, Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Advogado.